Entre Raízes e Concreto: Cartografia de uma Voz em Trânsito

Minha trajetória é uma travessia que entrelaça corpo-território, palavra-som e imagem. Sou uma artista nordestina em constante trânsito, e é nesse espaço de fronteira, entre raízes e ruídos, entre o mangue quente de origem e o concreto frio, que minha linguagem ganha forma.

Viver em deslocamento entre Recife e São Paulo há mais de 14 anos é mais do que uma condição geográfica: é um estado de corpo. Minha criação é atravessada por migrações físicas, afetivas e linguísticas. Esse trânsito não é apenas espacial. É uma reconfiguração contínua da escuta, da identidade e da presença. Venho aprendendo, como artista, a fazer da instabilidade uma linguagem. A migração exige reinvenção cotidiana, um gesto de resistência diante do apagamento e uma abertura radical ao risco.

A voz que existia em mim se encontrou com o palpitar urbano e, em contato com a cidade, se fricciona, se desdobra, sobrepõe camadas, se encorpa. Para mim, a palavra é corpo sonoro, território, ferramenta de presença e criação. Uma invenção que desafia limites e se refaz a cada fala.

Minha atuação transborda fronteiras entre teatro, performance, vídeo e imagem, em busca de uma voz expandida, sensorial, indisciplinada. O que proponho é uma arte do atravessamento. Uma voz que nasce no trânsito, mas não busca síntese. Ela abre frestas. É da fricção que emergem minhas criações.

Ao costurar linguagens, convoco paisagens que, assim como eu, não pertencem inteiramente a um só lugar. Paisagens que sonham.

Minhas imagens, sejam elas faladas ou fotografadas, não pretendem capturar o real, mas instaurar estados de presença. Imagens que perseguem o rastro do delírio.
Flerto com o onírico como escuta profunda:
uma forma de ver o que ainda não tem nome.

Este texto é um embrião de um trabalho teatral solo em processo de criação. Ele nasce do desejo de investigar, por meio da palavra e da presença, as camadas de uma voz em deslocamento, uma pesquisa que se propõe a ser expandida cênica e sensorialmente.